Os recados que presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mandou ao Exército brasileiro na sua visita a São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, esta semana, revelaram de forma escancarada sua estratégia de criar um “centrão militar”. O presidente mandou às favas os escrúpulos da consciência e esfregou na cara dos militares que eles são sócios de seu governo. A estratégia do “é dando que se recebe” ficou clara:
” Proporcionalmente temos mais ministros militares que naquele período de 64 a 85″, disse Bolsonaro, em referência à ditadura.
Os ministérios são o “dando” de Bolsonaro. E o “recebe”? O que ele espera em troca? O próprio presidente deixou claro: “tenho certeza que vocês (militares) agirão dentro das quatro linhas da constituição, se necessário for” .
O contexto da fala era sobre as eleições de 2022 e a ameaça da volta do inimigo comum: a esquerda. As quatro linhas do bolsonarismo, como todos sabem, são flexíveis. Ele considera, por exemplo, que o torturador Ustra agia dentro das quatros linhas. Que não era um criminoso fardado. E Bolsonaro acrescenta, em seu discurso, que o adversário político só será vitorioso em 22 se “nós esmorecermos”. Ele falou “nós” olhando para militares fardados. Da ativa.
Antes de explicar o que seja o “centrão militar”, o blog pede um minuto de sua atenção para fazer uma pequena excursão ao passado.
Os governos da ditadura tinham a Arena. Um apoio dispensável, pois quando havia alguma encrenca, fechava-se o Congresso.
Os governadores da Nova República, de Sarney a Temer, tinham o Centrão. O dispensável passou a ser o próprio presidente, pois quando havia alguma encrenca, fechava-se o Palácio até o vice assumir. Casos de Collor e Dilma.
E o que tem Bolsonaro? Bolsonaro tem o centrão tradicional, o civil, atraído com dinheiro do orçamento, mas seu grande esforço em dois anos de governo é no sentido de formar o centrão fardado. Um presidente com a autoridade cada vez mais esvaziada pelo desgoverno frente à pandemia, sabe que não pode confiar apenas no apoio político. E precisa de um centrão militar.
É bom lembrar que os seguidores do presidente pedem um golpe a cada comprimido de cloroquina. A tal intervenção militar com Bolsonaro no poder. O presidente os estimula no assanhamento autoritário. A novidade, esta semana, foi a forma escancarada ao tratar o Exército como sócio do governo e não uma instituição do Estado democrático de direito.
O método usado para criar seu centrão militar é o mesmo empregado na manutenção do centrão civil: verbas públicas. Qual político não gostaria de ouvir do presidente que tem um latifúndio de cargos à sua disposição? Os militares ouviram.
Não para por aí. Vamos falar do que no centrão político se chama de boquinha. Os primeiros “generais do centrão” a aderir à sociedade com Bolsonaro foram agraciados com um aumento que furou o teto salarial. Se Heleno, Braga Netto e Ramos fossem do “centrão civil” seriam chamados de marajás. Mas os militares não se vêem assim. Se consideram patriotas lutando contra os inimigos da pátria. O sujo é sempre a política.
Agora, vem a cartada final. Se o Exército prevaricar e não punir Pazuello, como quer Bolsonaro, a sociedade entre governo e Exército se transforma em união estável com papel passado.
Neste momento, Braga Netto e o comandante do Exército, Paulo Sérgio, estão dentro de um Puma no estacionamento do Riocentro. A bomba de três estrelas, o general Pazuello, já foi arremessada por Bolsonaro. Cabe a Paulo Sérgio e Braga Netto definirem sua biografia. Ou deixam, passivamente, a bomba estourar em seus colos, ou cumprem o Regulamento Disciplinar do Exército brasileiro e mantêm intactas a disciplina e hierarquia.
Fim. Da picada
O leitor atento, com certeza, vai chamar a atenção: “Eu comecei a ler por causa da título, o diabo veste Prada, e o centrão veste farda. O Prada foi só para fazer uma rima infâme?”
Procurado, o blog preferiu não se manifestar.